Espelhos e coisas mais estranhas

Há umas semanas eu reformei o banheiro. Isso acabou me fazendo pensar sobre umas coisas, além da incrível capacidade que uns poucos metros quadrados têm de espalhar a destruição.

No primeiro dia eu fiquei aqui acompanhando a obra, encastelada no quarto de TV. Ao meu lado estava o espelho antigo, encostado entre o sofá e a parede. Ficamos juntos uma tarde inteira.

É perigoso ficar muito tempo próxima a um espelho, a gente começa a refletir, com o perdão do trocadilho.

Eu vi vários fios de cabelo branco, e tive preguiça de arrancar todos eles de uma vez, como eu normalmente faço. As minhas olheiras pareceram enormes, assim como as minhas bochechas. Então aquele era realmente o meu rosto, a primeira coisa que as pessoas notavam em mim?

Eu não me considero uma pessoa bonita. Acho que às vezes eu até fico bonita, de propósito ou acidentalmente, mas esse não é o meu estado normal. E não, eu não estou usando o método alfabetização de conseguir elogios, só dizendo como eu me sinto mesmo.

Só que há uns cinco anos que eu achava que tinha a mesma cara, e agora me vem essa surpresa.

Quando eu era criança e adolescente eu parecia mais velha do que realmente era, o que eu achava bom. Não era um parecer mais velha estilo funkeira infantil, era um lance natural mesmo. Aí eu fiz 20 anos e a tendência subitamente se inverteu, eu comecei a parecer mais nova. Nunca entendi como essas coisas funcionavam.

Agora pela primeira vez na vida eu pareço ter a idade que eu realmente tenho, esses estranhos 31 anos. Às vezes eu fico olhando pra minhas jovens colegas de faculdade com suas peles lisinhas, e fico morrendo de vontade de pedir pra pegar no rosto delas (mas eu sei que é creepy e não pretendo fazer isso não).

A gente que é mulher passa a vida toda sendo ensinada que nada pode dar certo se não correspondermos ao padrão de beleza. O que é curioso, porque ser mais próxima desse padrão muda a vida de bem pouca gente.

Se você não é modelo, atriz, nem garota de programa, que diferença faz ser linda ou não? Tá, as pessoas podem te olhar com reverência, pode ser mais fácil entrar na balada, e passar o rodo na balada, mas isso não é meio acessório?

Eu sempre tento pensar assim quando bate aquela tristeza de me sentir feia (e agora velha). E paro e me pergunto: os grandes problemas da minha vida seriam resolvidos se eu fosse mais bonita?

Não, nenhum deles. Provavelmente os seus também não.

Agora é o momento em que a minha irmã me acusa de só escrever textos pras pessoas continuarem gordas, acomodadas e conformadas. Aceito defesas do meu raciocínio.

Mas antes eu preciso mesmo me livrar desse espelho.

Publicado por

Camila Freire

Humorista amadora e desistente profissional Além de um blog tenho também uma newsletter sobre luto, doenças, família, sofrimento, redenção, bolo de chocolate e eu rindo de tudo isso. Com gifs. https://www.getrevue.co/profile/tempopracontar

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